Estratégia Comum de Desenvolvimento Transfronteiriço
Jornal Expresso 4 de Setebro; Estratégia ibérica para a
fronteira vai beneficiar 62% do país
“Queremos pôr o interior do país no centro do mercado
ibérico” diz a ministra da Coesão Territorial, Ana Abrunhosa, sobre o plano
traçado com Espanha
A Estratégia Comum de Desenvolvimento Transfronteiriço que
os governos de Portugal e Espanha vão assinar na próxima Cimeira Luso-Espanhola
agendada para 2 de outubro, na cidade da Guarda, deverá beneficiar 62% do
território português e 17% do país vizinho
O objetivo é tirar partido da cooperação transfronteiriça
para tornar os territórios raianos mais atrativos para viver, trabalhar ou
investir. Não só os espaços rurais mais próximos da fronteira, mas também a
rede de centros urbanos de maior dimensão que podem dar escala e massa crítica
a esta solução orquestrada pelos dois governos para dinamizar, de vez, aquela
que é a fronteira mais pobre de toda a União Europeia
Ferrovia, Estradas 5G. 112 Transfronteiriço. A figura de
trabalhador de fronteira
A lista de medidas a anunciar dentro de um mês pelo
primeiro-ministro António Costa e o seu homólogo espanhol, Pedro Sánchez,
pretende melhorar diretamente a vida de 5 milhões de pessoas. Do lado
português, são quase 1,7 milhões de habitantes de 1551 freguesias, incluindo
cidades como Bragança, Viseu, Guarda, Castelo Branco ou Évora. Do lado espanhol,
outros 3,3 milhões de habitantes dos 1231 chamados “municípios” de províncias
como Badajoz, Cáceres, Ourense, Pontevedra, Salamanca ou Zamora.
Mas a ideia é precisamente captar mais pessoas para os
territórios da raia. Como? “Pondo o interior de Portugal no centro do mercado
ibérico”, responde a ministra da Coesão Territorial, Ana Abrunhosa.
QUE MEDIDAS VÊM AÍ?
“É a primeira vez que temos uma estratégia comum para os
territórios fronteira”, sublinha a ministra Ana Abrunhosa sobre o trabalho que
tem desenvolvido com a secretária de Estado da Valorização do Interior, Isabel
Ferreira. “E estratégia não é só um papel, um documento teórico, mas uma lista
de medidas concretas que foram coordenadas pelo Ministério da Coesão
Territorial, trabalhando em conjunto com todos os ministérios do Governo
português e em cooperação com o Governo espanhol.”
Sem querer divulgar a lista das medidas a anunciar na
cimeira de outubro, a ministra revelou ao Expresso apenas alguns exemplos
concretos de como projetos conjuntos (envolvendo Portugal e Espanha) e
integrados (envolvendo serviços públicos de vários ministérios e a iniciativa
privada) podem inverter o definhamento dos territórios fronteiriços.
É o caso da revitalização de Vilar Formoso enquanto porta de
entrada de Portugal através da parceria entre o investimento público e privado,
incluindo a grande distribuição: “Os projetos até já estão em curso para
arrancarem em 2021.” A ministra conta com a iniciativa privada para dinamizar
outra ideia emblemática: a criação de “aldeias de nómadas digitais” para
profissionais de empresas tecnológicas, por exemplo.
CINCO EIXOS DE ATUAÇÃO
Além de fortalecer a dinâmica de cooperação, a Estratégia
Comum de Desenvolvimento Transfronteiriço visa garantir a igualdade de
oportunidades e o livre exercício dos direitos de cidadania em ambos os lados
da fronteira; assegurar a prestação adequada de serviços básicos adaptados ao
território e aproveitando os recursos em ambos os lados da fronteira; fomentar
o desenvolvimento de novas atividades económicas e iniciativas empresariais e
promover a fixação de população nas zonas transfronteiriças.
O primeiro eixo de atuação será incentivar a mobilidade
transfronteiriça e eliminar os custos de contexto, designadamente através da
criação da figura do chamado trabalhador transfronteiriço.
Vem aí a figura do trabalhador transfronteiriço, aldeias de
nómadas digitais ou o 112 transfronteiriço
O segundo eixo será melhorar as infraestruturas e a
conectividade territorial, incluindo as questões de internet e da rede móvel
nos territórios de fronteira. Neste domínio, o Governo espanhol já revelou a
intenção de investir na ferrovia e na rodovia, coordenar os sistemas
cartográficos para facilitar a implantação do automóvel autónomo ou de apostar
na conectividade digital e nos projetos-piloto 5G. O primeiro-ministro
português também já prometeu que “será precisamente no interior a primeira
ronda de instalação do 5G para dar todas as condições às empresas” que aí se
queiram instalar. E revelou algumas das ligações rodoviárias a concretizar
O terceiro eixo passa pela coordenação dos serviços básicos
como educação, saúde ou serviços sociais. O 112 transfronteiriço, por exemplo,
permitirá ao doente ser acorrido mais depressa pela ambulância mais próxima,
seja ela portuguesa ou espanhola.
O desenvolvimento económico e a inovação territorial terão
direito a um eixo específico. E haverá um quinto eixo dedicado ao ambiente,
energia, centros urbanos e cultura.
Os fundos europeus contribuirão para o financiamento da
Estratégia, venham eles do Portugal 2030, do Instrumento de Recuperação e
Resiliência ou de outros programas europeus. Mas a ministra Ana Abrunhosa frisa
que muitas medidas não dependem de dinheiro: “É preciso vontade política e
articulação entre os serviços administrativos de Portugal e Espanha.”
Foi na Cimeira Luso-Espanhola de Vila Real, em 2017, que
António Costa e o então chefe do Governo espanhol, Mariano Rajoy, decidiram
apostar na cooperação transfronteiriça para valorizarem este “amplo espaço
regional que partilham, dotado de coerência e vida própria, com um enorme
potencial de afirmação económica e de modernização do tecido produtivo pela sua
centralidade no espaço da Península Ibérica”.
Na cimeira do ano seguinte, já com Pedro Sánchez, ambos os
governos se comprometeram “a promover e coordenar esforços para estabelecer
orientações e recomendações à escala nacional e peninsular que permitam o
desenvolvimento de novas políticas, estratégias e programas específicos
dirigidos ao combate ao despovoamento, envelhecimento e à revitalização
socioeconómica dos meios rurais mais vulneráveis” nos territórios de fronteira.
INVESTIMENTOS
MAIS ESTRADAS DE BRAGANÇA A ALCOUTIM
O primeiro-ministro, António Costa, revelou esta semana que
a Estratégia Comum de Desenvolvimento Transfronteiriço “é a oportunidade para
fazermos de norte a sul aquelas pequenas ligações que há muito foram pensadas e
são sempre adiadas”. É o caso da ligação Bragança à fronteira, do IC31 entre
Castelo Branco e Monfortinho, da ligação entre Nisa e Cedillo ou a ponte entre
Alcoutim e Sanlucar. Tudo “pequenas ligações fundamentais para que o interior
deixe de ser interior e passe a ser o eixo de estruturação desse grande mercado
ibérico”. António Costa considera “inexplicável” que a única região de
fronteira deprimida em toda a Europa seja precisamente a de Portugal e Espanha.
“Sabemos que a história o explica, mas sabemos também que a história mudou.
Hoje somos aliados na NATO, somos parceiros na UE e é a altura, de uma vez por
todas, de a fronteira deixar de ser uma barreira e passar a ser uma ponte que
dê ao interior uma centralidade no mercado ibérico.”
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